Para Joel Jota
Às tardes de terça, passava uma
vendedora de redes na nossa rua e eis que um dia:
– Todas as casas precisam de pelo menos uma rede, senhor! Essa aqui tamanho família, então, tem tudo para se acomodar em sua casa.
A moça leu o interesse no meu silêncio, desenrolando todos os modelos e cores diante da minha respiração.
– Maria da Esperança é meu nome. Pode comprar sem medo, senhor Joel.
Sem abrir a boca, espantado, simulei o gesto do ... “Como assim?”
– Não se preocupe. Sei o nome de todos moradores. Qual peça vai levar hoje?
A resposta ficou aguardando a deixa, enquanto Maria da Esperança discorria seu “corre”: criança na escola, ajeitada na casa de Dona Marlene, almoço, as obrigações do dia.
– Me conte uma coisa, Maria: se você vendesse todas essas redes de uma única vez, o que faria com a grana?
– Ah, a primeira coisa? Eu agradeceria aquele lá de cima. Isso seria Ele atendendo um milagre; é que peço todo dia por isso.
O vento mudou de direção de repente para que eu pudesse sentir a verdade nas palavras de Maria da Esperança.
– Depois pagaria o fornecedor das redes, pois o que é meu é meu, do outro é do outro, o justo, sabe?
A moça foi desenrolando todas as partes de um plano muito arquitetado:
– No próximo final de semana, eu
voaria pro Ceará com meus filhos. Íamos visitar mamãe. Só assim o caçula vai
conhecer a vó. São sete anos, senhor Joel.
Naquela hora, o suspiro da guerreira.
Ofereci água à Maria, assim ela ia se recompondo, aos poucos, um respiro. Muito
forte.
– Vou lá buscar água. Faça-me um
favor, enquanto isso: calcule o valor de todas as redes, preço real, sem
desconto, entendeu?
– Sim! – disse dona Esperança, mãos
trêmulas na bolsa atrás da calculadora.
Água na jarra, o copo, o celular e
chamei os meninos para a rua.
– Aqui um pouco de água. Se quiser um
suco, a gente prepara. Esses são meus tesouros ... fez a soma?
– Muito obrigada! Que meninos lindos
o senhor tem. Ah, o valor é esse aqui, ó!
– Você aceita mais um pouco de água?
– Tô satisfeita! Deus aumente. Já vou
indo.
– Com licença, mas não vá ainda. Qual
é a chave do seu PIX, Maria? Os meninos ficara olhando a reação da moça.
Nessa hora, Maria mudou de cor e
começou a sorrir e a ficar inquieta até que seus olhos passaram a brilhar ainda
mais. Ela havia entendido que eu também acredito em milagres.
– Maria, no próximo final de semana
vocês estarão na casa de sua mãe. Filhos, todas essas redes são nossas...
agora.
A essa altura, Maria Esperança deve
estar a agradecer pela nova quantia na conta, o ato, o fato. Um milagre?
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