Há
tímido por toda parte. O sofrimento deles é representado de inúmeras formas. Em
algumas situações, da infância à velhice.
–
Filha, o senhor Wanderley está lhe cumprimentando. Você não vai dar um bom dia?
Nem
boa tarde. Muito menos uma boa noite. Meio desajeitada, a garota levantava a
cabeça e olhava para o porteiro da escola. Levou quase dois anos para lhe
dirigir a palavra. Motivo? Timidez.
O
tímido tem dificuldade para pertencer a quaisquer grupos. Eles encharcam as
camisas, transformam as mãos em fontes trêmulas de suor, quando vão apresentar
um trabalho na escola ou na empresa.
Ao
receber um elogio sincero, ele rapidamente tem na sua face o mais vermelho dos
vermelhos. Conhece alguém assim?
Por vias
da circunstância, o tímido é o espelho da insegurança. Basta uma dupla se
afastar para uma conversa em particular sobre qualquer coisa, o tímido pensar
ser o assunto de tal prosa.
Luis
Fernando Veríssimo, um dos maiores cronistas do Brasil, sempre demonstrou timidez
nas entrevistas.
Clarice
Lispector declarou algumas vezes que era uma “tímida ousada”! É possível
imaginar isso de uma das musas da literatura?
E
como seria o encontro de dois tímidos? Um desastre para ambos. Travam-se.
Contaram-me
certa vez que Mia Couto, escritor moçambicano, em viagem ao Brasil, encontrou
nos corredores da editora Companhia das Letras com o cantor e compositor Chico
Buarque. Disseram-me que foi uma sucessão de tentativas, vários ensaios. Nenhum
conseguiu render assunto. Muito sem jeito, tudo ficou em um “oi”.
O
tímido sofre para fazer uma ligação telefônica e resolver assuntos aparentemente
banais.
Desconfio
que a sensibilidade advenha das observações que regem seu “estar no mundo”.
Desconfio
que a decisão de um tímido é mais sábia do que de uma “pessoa saidinha.” Antes
das ações, ele tece possibilidades, reflexões.
Desconfio
que há um tímido lendo as impressões deste cronista intrometido, mas que jamais
vai me procurar para dizer que não é nada disso, que estou equivocado.
O
tímido precisa de um tempo maior, diferenciado. Um tempo para aproximar. Ele é
acanhado.
“Por conta da
timidez, aprendi a beijar com os olhos”
Está
lembrado do início desta crônica? Sabe aquela garota que gastou o maior tempão
para cumprimentar o porteiro?
Em
uma manhã dessas aí, ela despediu do pai, sacou a grana do lanche no bolso da
mochila e saiu em disparada rumo à cantina da escola. Lá comprou a merenda
sozinha. Voltou toda contente para a fila. SOZINHA.
Comprar
um lanche pode parecer a ação mais simples do mundo, mas para uma criança
tímida, isso é sinônimo de grande conquista.
Talvez
a garota não saiba, mas aquele foi um dos dias mais felizes para seu pai e sua
mãe (essa também é muito tímida).
E
depois daquela cena majestosa, fui motivado a escrever esta crônica com o
intuito de propor aos extrovertidos a ideia de que um dia toda timidez será
elogiada.
Imagem disponível em: http://educarparacrescer.abril.com.br/comportamento/como-ajudar-adolescente-lidar-timidez-743074.shtml
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